O homem que caiu na terrinha
Encontro Johnny Hooker numa mesa, separados por copos de uísque (eu) e cerveja (ele).
Olhando atentamente ele não parece tão sexualmente ameaçador quanto no palco. Ao contrário, vejo um garoto magro e tímido, um nerd de olhar vago que demora a relaxar e soltar a língua, muito diferente do seu alter ego: o rockstar/super herói, inicialmente concebido para proteger uma paixão adolescente, a “putinha” da escola, a típica garota livre que as meninas invejam e os caras desejam, a moça que fascinou nosso Clark Kent e o inspirou a se transformar num Hooker, o cafetão alienígena, o anjo que caiu na terra e se deixou perverter pelo nosso mundo, cego por poder, doente de excessos.
Johnny tinha 15 anos quanto, influenciado por “The Rise and Fall of Ziggy Stardust and The Spiders from Mars”, de David Bowie, resolveu construir seu próprio mito usando a música como forma de expressão. Por detrás da cópia descarada, uma associação inquieta: o balbuciante e saguinário Coronel Kurtz, do filme Apocalipse Now, também ele um anjo caído, corrompido pela horror da realidade. Seis anos depois, longe da sombra de Bowie e empenhado em construir sua identidade musical, Johhny, de fato, se tornou um alienígena na cidade do Recife e seus tambores e reverências ao, cada vez mais institucionalizado, Mangue Beat. Roqueiro e assumidamente retrô, suas influências são obsessivas e datadas, sua postura andrógina não permite a piada da caricatura gay mas espalha amor e desprezo em grandes quantidades.
Nosso homem que caiu na terrinha se faz acompanhar por um clássico power trio, o Candeias Rock City, o que sugere uma contradição: por que um grupo tão deslocado do tempo e do espaço se auto batizaria com o nome de um bairro de Jaboatão dos Guararapes? A resposta, no release é que “todo artista deve eleger um lugar como seu, se apropriar do espírito, dialogar com seus personagens, contar sua história...”
Johnny é fruto de uma geração que tem a região metropolitana do Recife como referência mas - diferente dos mangueboys da década de 90 - não se preocupam em expor isso como força estética ou bandeira idealista. A música é do Recife porque é feita aqui. E ponto final! Niilistas cheirando a leite, filhos de uma classe média apática e entediada, moleques superdosados de internet, filmes e games, assistindo a tragédia do mundo em telas de LCD, passeando pelas ruas sebosas do Recife Antigo, coerentes na insatisfação irônica como na letra da Caravana do Delírio, uma das bandas favoritas do próprio Johnny: “o povo unido sempre sai ferido” (...) “ te cuida, meu filho, não deixa o sistema nervoso”. Cinismo em baldes, descrença mas não falta de inteligência, “o belo travesseiro do caos”, apregoado pelo filósofo romeno Emil Cioran aplicado à cidade.
Talvez um dia, na saída do aeroporto, vejamos um cartaz de Procura-se. Nele, a foto do nosso Hooker e abaixo, seu crime: transformar jovens machos bairristas pernambucanos em bichas céticas e abusadas.
Go Johnny, go!
Olhando atentamente ele não parece tão sexualmente ameaçador quanto no palco. Ao contrário, vejo um garoto magro e tímido, um nerd de olhar vago que demora a relaxar e soltar a língua, muito diferente do seu alter ego: o rockstar/super herói, inicialmente concebido para proteger uma paixão adolescente, a “putinha” da escola, a típica garota livre que as meninas invejam e os caras desejam, a moça que fascinou nosso Clark Kent e o inspirou a se transformar num Hooker, o cafetão alienígena, o anjo que caiu na terra e se deixou perverter pelo nosso mundo, cego por poder, doente de excessos.
Johnny tinha 15 anos quanto, influenciado por “The Rise and Fall of Ziggy Stardust and The Spiders from Mars”, de David Bowie, resolveu construir seu próprio mito usando a música como forma de expressão. Por detrás da cópia descarada, uma associação inquieta: o balbuciante e saguinário Coronel Kurtz, do filme Apocalipse Now, também ele um anjo caído, corrompido pela horror da realidade. Seis anos depois, longe da sombra de Bowie e empenhado em construir sua identidade musical, Johhny, de fato, se tornou um alienígena na cidade do Recife e seus tambores e reverências ao, cada vez mais institucionalizado, Mangue Beat. Roqueiro e assumidamente retrô, suas influências são obsessivas e datadas, sua postura andrógina não permite a piada da caricatura gay mas espalha amor e desprezo em grandes quantidades.
Nosso homem que caiu na terrinha se faz acompanhar por um clássico power trio, o Candeias Rock City, o que sugere uma contradição: por que um grupo tão deslocado do tempo e do espaço se auto batizaria com o nome de um bairro de Jaboatão dos Guararapes? A resposta, no release é que “todo artista deve eleger um lugar como seu, se apropriar do espírito, dialogar com seus personagens, contar sua história...”
Johnny é fruto de uma geração que tem a região metropolitana do Recife como referência mas - diferente dos mangueboys da década de 90 - não se preocupam em expor isso como força estética ou bandeira idealista. A música é do Recife porque é feita aqui. E ponto final! Niilistas cheirando a leite, filhos de uma classe média apática e entediada, moleques superdosados de internet, filmes e games, assistindo a tragédia do mundo em telas de LCD, passeando pelas ruas sebosas do Recife Antigo, coerentes na insatisfação irônica como na letra da Caravana do Delírio, uma das bandas favoritas do próprio Johnny: “o povo unido sempre sai ferido” (...) “ te cuida, meu filho, não deixa o sistema nervoso”. Cinismo em baldes, descrença mas não falta de inteligência, “o belo travesseiro do caos”, apregoado pelo filósofo romeno Emil Cioran aplicado à cidade.
Talvez um dia, na saída do aeroporto, vejamos um cartaz de Procura-se. Nele, a foto do nosso Hooker e abaixo, seu crime: transformar jovens machos bairristas pernambucanos em bichas céticas e abusadas.
Go Johnny, go!