sábado, janeiro 21, 2006

Deise ganha asas

Rua Augusta, São Paulo. Moças com muito passado e pouco futuro circulam entre travestis e clientes. Encravado entre shows de streep-tease, casas de jogatina e botecos suspeitos, está o Vegas, empestado de fumaça, barulho e suor. Naquela noite quente de segunda-feira Deise Tigrona daria o ar da graça para um público predominantemente GLS. Tímida e franzina, ela se transforma assim que empunha o microfone e manda essa: “Tem que ser muito homem pra dar o c*!” A platéia empolgada reage aos gritos. O show começa.
Deise está feliz e tem motivos para isso. Ela está em vias de encerrar seu contrato com o chefão do baile funk, DJ Marlboro. Sob sua proteção ela tinha garantido várias apresentações diárias em bailes no Rio, músicas tocadas no Big Mix, principal transmissão do gênero, e entrada fácil em programas da Rede Globo.
Mas agora Deise é livre para se reinventar como artista. Ela convidou admiradores do porte de Daniel Bozio e Tejo Damasceno, do Coletivo Instituto, e DJ Nuts, o melhor turntablist do país, entre outros, para produzirem faixas para o disco que celebrará sua alforria. Como qualquer artista de seriedade Deise quer ir além do que tem em suas mãos. Esse “ir além” significa atingir mais gente, ganhar respeito e, o mais difícil: superar o enorme muro de preconceito e estigmatização que ronda o baile funk.
É muito fácil para a terrível classe média do Brasil aceitar os artistas do funk como personagens folclóricas e estereotipadas. É muito mais fácil rir das letras engraçadas de caráter pornô e manter uma relação com o gênero musical como quem vai ao zoológico ... Tudo visto à distância.

Catra

Outro que tem uma longa lista de serviços prestados ao funk carioca é Mr. Catra, que tenta também sua emancipação num disco de longa gestação, sem previsão de saída. Tive acesso às faixas e, endossando as palavras do produtor Marcos Boffa (Eleterônika, Sonar ...), diria que, se o Brasil tivesse uma distribuição de renda mais justa, o funk seria tão grande aqui quanto o hip-hop é nos Estados Unidos.
As letras de Mr. Catra são contundentemente violentas. Ele reza a dura cartilha de ética do morro com fervor. Sua rima é exata e sua música traz a explosiva combinação de baile e bandidismo.

Todos por um

Fala-se muito nessa coluna de criação coletiva. O livro “Emergência, a dinâmica de rede em formigas, cérebros e softwares”, de Steven Johnson, é uma excelente reflexão sobre poder descentralizado e auto-organização. Teórico do Ciberespaço, o autor apresenta interessantes comparações entre biologia e cultura. Altamente recomendável!

Silver Apples

O leitor Mateus Toledo ganhou o CD do DJ Dolores X Instituto: Narradores de Javé pela indicação de um grupo, segundo suas palavras “tão denso e claustrofóbico quanto o Velvet Underground” e “soa como se o mc5 (ou o Stooges, tanto faz), mal comparando, se metesse a fazer "plings" e "plóings" com o maquinário jurássico disponível então no período. È isso aí: incomodou a acariciou estes ouvidos furados.

1 Comments:

Anonymous Anônimo said...

O Brother, não acho que tudo que venha da favela seja bom. Tem muito funk carioca bom, mas achar que tudo que envolva banditismo seja bom, isto é papo de romântico babaca. Vivemos uma guerra no Brasil. Acho uma pena que o Funk carioca esteja associado ao banditismo. E no seu começo não era. Para você que deve ser classe média, já que não mora na favela, deve ser fácil achar que estas letras sinistras sejam prova de progresso intelectual. Quero ver você conpactuar com a ética dos tribunais do tráfico de droga, quando pessoas do morro são simplesmente executadas por não concordar com a ditadura dos traficantes. É uma guerra e, como tal, a ética não existe. Existe é uma espécie de brutalidade e um certo absolutismo da polícia e dos traficantes e o resto do povo que quer viver dignamente já não tem esperança nenhuma. E isto é lamentável. É lamentável também esta juventude ligada ao tráfico ter pouquíssimo tempo de vida, poucos chegam até os 30 anos. Não compactuo com traficantes que saem mutilando pessoas com machado, criando o terror, como é o caso de Patrick do Vidigal. Eu só espero que este argumento marginal todo resulte em algo de bom para a favela. Acho que afasta mais que agrega. Serve muito mais como um radiografia do que como uma melhora para a favela. E é fácil falar que a classe média vê de longe. E quem vai para o Vegas? è favelado? Quanta hipocrisia.

9:13 PM  

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