sexta-feira, janeiro 27, 2006

Ciganos na Babilônia

Seis dias em Nova Iorque: frio de lascar - embora não seja o inverno mais rigoroso da cidade - cinco performances em quatro clubes diferentes, visitas a gravadoras, livros incríveis, discos desejáveis e, para circular pela cidade, metrô durante o dia e táxis à noite.
Em nenhuma vez a nacionalidade do taxista se repetiu. Do sudanês gente fina ao mexicano mau humorado, do melancólico paquistanês ao gentilíssimo negro de Trinidad Tobago que planejava passar férias no Brasil, ouvi sotaques carregados e distintos que me fizeram crer que se a Babilônia existe ela é Nova Iorque.
A Babilônia tem abrigado sonhos de riqueza e de mera sobrevivência, gente de todas as partes do mundo envenenam a caretice americana com seus temperos éticos. Perseguidos buscam a paz no meio do caos da cidade, ralés do mundo inteiro vêem lá a chance de uma nova vida. Esse foi o caso da família de Eugene Hütz, ucraniano e líder do Gogol Bordello, principal grupo de uma cena que só poderia existir em Nova Iorque, os ciganos punks.
Eugene Hütz é um figuraço. Perguntado sobre seu disco favorito de world music ele respondeu que era o primeiro do Dead Kennedys, Fresh fruit for rotting vegetables, porque “de onde eu vim isso é world music”. Apesar de lançados por um selo especializado em hardcore, a música do Gogol Bordello reflete a sede de conhecimento típica de quem nasceu na beira do mundo e tem de tudo um pouco: ragga, rock, escalas do leste em acordeons e violinos e, em 60 revolutions, do disco Gypsy Punks, uma inusitada influência latina. Alegre, rápido e selvagem, Hütz também escreve letras inteligentes que mostram o ponto de vista do imigrante na Babilônia em sugestivos títulos como Green Card Hussband, Imigrant Punk e, meu favorito, Think Loccally Fuck Globally.

O DVD da semana

Se você acha que house music é aquela coisa chata que toca nos clubes do Recife, está na hora de rever seus conceitos. Maestro, de Josell ramos, capta a gênese do estilo, tendo como centro o lendário Lerry Levan, residente do Paradise Garage, clube novaiorquino que catalisou a cena no fim da década de 80.
Dance music além do escapismo da disco, a cena house entre chicago e a Babilônia foi trilha sonora para uma intensa movimentação social reunindo negros, latinos e o incipiente orgulho gay.
A história é contada através de freqüentadores, produtores e DJs como Frankie Grasso (detonadíssimo), Danny Tenaglia e François K.

O pensamento da semana

Li, e achei que vocês iam gostar, uma citação de Issac Singer logo na primeira página de My Idea of Fun, do escritor inglês e pau-pra-toda-doidice, Will Self: Digo pra mim mesmo para não ficar chocado mas todas as vezes me choco novamente pelo que as pessoas fazem para se divertir, por razões que elas mesma não sabem explicar.

O mico da semana

Ver um músico genial como Dominguinhos cantar o hino de Pernambuco para vender material de construção é constrangedor. O pior é que, num tremendo clichê publicitário, sua voz é precedida por vozes de “populares” com sotaque ... do sudeste.
Ninguém merece.